Impressões de um participante do IV Fórum Internacional da ACP

Elias Boainain Jr.

Aos dez dias do mês de agosto deste Ano da Graça de Nosso Senhor Jesus Cristo, eu, Dom Elias (lo que camina) escrivão mor da nave transdimensional Grupal, mando noticias dos últimos acontecimentos a Vossa Majestade a respeito do andamento de nossa expedição.

Como sabeis, outrora os grandes descobridores acreditam nas descobertas dos novos cientistas, como Copérnico e empreenderam arriscadas viagens para provar que nossa Terra não tinha limites, não era plana, tão pouco era centro do Universo, Lançaram-se ao mar, unicamente guiados pela fé e a esperança de que era possível chegar ao oriente dirigindo se ao Ocidente, de que era possível circunavegar a Terra, completar o abraço chegando ao mesmo ponto, chegando a si mesmo, após ir a mais longe possível.

Como navegantes mais antigos ainda, tinham o fascínio do mar, do desconhecido, do descobrir, fascínio este mais forte que a própria vida, que a própria segurança das fronteiras limitada, da terra firme sob os pés.

Navegar é preciso …

Viver não é preciso

Era seu lema, era sua forme de ser e o eco de suas canções, e o eco deste refrão ecoou e nossos aventureiros corações nestes fins de século XX, pelo que, contando com as boas graças de Vossa Majestade, foi organizado nova expedição de descobrimento.

Acreditamos nos novos cientistas e nas melhores esperanças de nossos corações; acreditamos nos misteriosos chamados nas obscuras mensagens, nas vagas intuições e mais uma vez buscamos redelimitar o universo, revolucionar a cartografia da realidade; Acreditamos que o universo é holístico, sem limite, interconectado transdimensionalmente, com passagens além do tempo e do espaço, com um centro além do todo e da parte, onde o microcosmo e o macrocosmo se encontram. Assim sendo, partimos com festa e a benção de Vossa Majestade, que confiou em nós, dando-nos apoio e votos de melhor augúrio, e , sob a graça de Nosso Senhor Jesus Chisto e Sua Digníssima Mãe Nossa Senhora da Esperança e do Perpétuo Socorro que sempre protege los que son sinceros na intecion e humildes tementes de Dios Padre em el corazon,

Majestade, nossa nave tem passado por perigosas, envolventes, enfeitiçadoras calmarias, que tem deixado o ânimo dos homens mui baixo. Não se fala mais em chegar, embuscar; quedamos entorpecidos em fiestas, distrações, superficialidades, gozo dos sentidos, ilusões de alegria fugaz… Como uma insidiosa neblina, misterioso encanto de sereias, parecemos perdidos a deriva em um estranho mar. Muitos navegantes da tripulação parecem guardar nosso espírito original, nuestro intento de buscar la verdad mas profunda sobre a pessoa; tendo nisto alvo mais preciosa que o próprio viver seguro de um mundo conhecido. Se vê no fundo de seu olhos insatisfeitos a mágoa, the sorrow, de estar vendo a tripulação falar em voltar, falar que nossas descobertas, que nossa aventura, já foram suficientes, que talvez não haja muito mas lo que descobrir, que devamos aceitar que a pessoa é limitada, que não se pode arriscar guiar-se pela bússola interior nem confiar infinitamente na capacidade das naves da ACP. Bastou-lhes um pouco de aventura, um pouco de alegria, um pouco de contato, e já se sentem grandes navegadores, grandes aventureiros, se esquecendo que as melhores esperanças da humanidade se depositam nas descobertas de nossa expedição, que a verdade que buscamos, que o caminho da interconexão entre o profundo do ser, o todo da humanidade e o Universo do Criador existe, e representa a única saída de transformação do nosso velho mundo em de sagregação e auto-destruição crescente. Sabeis Majestade que tudo isto me parece muito triste e vergonhoso, melhor talvez fora que não voltássemos do que voltar com tão pobres notícias… Rezei muito esta noite que passou, na Capela de nossa nave, dedicada a Santa Bárbara que protege os navegantes do raio e da tempestade, para que nos ajude a reencontrar o rumo, para que voltemos a caminhar ligeiro nas correntes e no vento, que escapemos desta calmaria e que os verdadeiros navegantes sobrepujem o derrotismo e a pouca nobreza de espírito e visão que grassa entre a tripulação entorpeci da pelo vinho e ensoberbada por descobertas pobres. Rezei a Santa Bárbara, a Nossa Senhora e o Menino, para que.consigamos logo avistar o lendário farol da Sagrada Família pois, senão com os mantimentos no fim e o tempo a se esgotar, não haverá forma de convencer a tripulação a continuar. Ah Majestade, e pensar que a viagem começou tão bem, que quando me juntei à expedição no domingo, logo à chegada, me pareceu já estarmos todos no rumo certo, em pleno Mar da Empatia. Olhava nos olhos dos navegantes e imediatamente os compreendia; escutava-os falar e imediatamente identificava os mesmos temas: transcendência, espiritualidade, todo, mutação, fé, compreensão verdadeira, conexão universal na profundidade da pessoa, fraternidade terrestre em uma família humana, empatia como a parta… Depois, parece que voltamos um pouco atrás, verificamos que não estávamos de fato no Mar da Empatia, apenas recebendo mensagens de lá, avistando-o ao longe, de luneta, desde o cesto da gávea do mastro-mor de nossa embarcação. Assim, anteontem, tive muitas visiones, consultei meus incertos mapas e conclui estarmos atravessando o Sexual Ocean, porta de entrada do lendário Mar da Empatia, onde as poderosas correntes e o precioso vento da Quarta Atitude nos levariam a Transcentrar, interconectando oriente com o ocidente, amplitude com profundidade, pessoa com humanidade… Via nosso barco dirigindo-se para os dois lados de um círculo, de um globo, tendo duas proas; uma comum a figura de mulher, outra com uma figura de homem, uma com uma abertura profunda de genital feminino, outra com uma aguda e penetrante forma de genital masculino, que circunavegando o globo dos opostos se encontras sem e, fechando o círculo, penetrássemos em seu interior, em estado de empatia, e pudéssemos seguir viagem.. Cresceram minhas esperanças quando à noite houve uma linda fiesta e, no começo da música, as mulheres todas dançavam juntas no espaço de danças, mas os homens (combinados) não iam dançar, olhavam de longe, se fazendo de difíceis e logo começaram a dançar juntos também, em outra esfera isolada do salão. As mulheres nos chamavam, mas respondíamos que não, com gestos másculos nos negávamos a ir. Elas nos chamavam, nos imploravam que fôssemos, tão lindas, tão a colhedoras, tão maravilhosamente sedutoras… Negávamos todavia e então elas tentavam se aproximar, seguravam um de nós e puxavam, mas nós segurávamos o companheiro e o salvávamos. Puxávamos de lá e de cá, e em certo momento pôs-se uma mesa a dividir os dois grupos, ambos empurrando-a um contra o outro, até haver a ruptura: Como uma corrente penetrante o grupo masculino atravessou até o fim, rompendo por entre amassa feminina, que se abriu toda, quedando todos nós em um delicioso movimento circular indiferenciado sexualmente, dentro de uma grande roda, onde dançamos, bailamos como um só corpo. Em pathy!

Como no poema recebido por Teresinha Peres na brincadeira de “Correio Elegante” a empatia surge de dois círculos distintos (Mi Rostro, Tu Rostro) que se interpenetram pelos olhos (Tu ojos, los rios) que se inter-envolvem, acolhem, pela boca e pelo som (Tu boca em la mia), se tornando um só (Tu corpo es lo nuestro)…

Mas não penetramos nesta esfera e continuo aguardando “Com ansia, ternura y amor”.

IV FORUM INTERNACIÓNAL DA ACP – IMPRESSÕES DE UM PARTICIPANTE

• Este texto foi escrito durante o Fórum e faz parte do 4º. capítulo do trabalho ainda incompleto do autor: TRANSCENTRANDO – INDO ALÉM DA PESSOA. Elementos para uma aproximação entre ACP e Psicologia Transpessoal.

Publicado no Boletim da ACP – Núcleo Paulista – no. 10 – outono 1990 p.4 e 5